Uma nuvem só acontece se chover
Desde o dia 1º já fez um mês da morte de Nana Caymmi. Se ela tivesse interpretado unicamente a composição “Eu não existo sem você”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, já teria ficado no painel antológico das interpretações: “uma nuvem só acontece se chover”.
O presidente da República do período 2018/22 que não permitiu a inscrição de Nise da Silveira no panteão dos filhos da Pátria parece estar fazendo escola ranzinza no atual. Lula não disse uma palavra pela morte de Nana, nem vai dizer, porque em entrevista em 2019 ao jornal Folha de S. Paulo, ela pareceu solidária ao atingido pela facada brutal.
Ela desceu a lenha no PT e no PMDB e cognominou Caetano Veloso, Gilberto Gil e outros como “chupadores do pau do Lula”. Lula, desbocado no privado, deixou a sua assessoria elevar a uma declaração de guerra. A grandeza da arte em Nana não se impôs sobre o tosco da política. A ANTA na presidência não deu um pio, como seu parceiro de carreira de 18.
Durante o governo Bolsonaro partiram Bibi Ferreira, Jô Soares, João Gilberto, Nelson Pereira, Paulo José, Milton Gonçalves e Elza Soares. Nenhum pio foi exarado pelo presidente. Entupido das angústias da existencialidade e desse Brasil que não decola nunca – eternamente o país do futuro –, Flávio Migliaccio sucumbiu. Menos ainda piou pelos que a Covid carregou, como Aldir Blanc se equilibrando entre “o bêbado e o equilibrista”, na canção eternizada por Elis Regina. E mais: Nicette Bruno, Carlos Lessa, Nelson Sargento, Sergio Sant’Anna e Paulo Gustavo, entre os milhares de anônimos, para o presidente que nunca desejou ser um coveiro.
Nana, se tivesse chance de saber da reação da Anta em seu terceiro mandato, porque nenhuma, no mínimo estalaria uma banana, daquelas que todo menino já deu um dia. Caetano e Gilberto Gil não reclamaram da acusação de chupões do pau do presidente atual. Recolheram-se em contrição e choraram a morte acontecida. Na tal entrevista à Folha, Nana disparou 89 palavrões em 71 minutos, mas para ser eterna bastou interpretar “Eu não existo sem você”, porque “UMA NUVEM SÓ ACONTECE SE CHOVER”.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA