Lampião para governador
O líder cangaceiro mais famoso do Nordeste quis um estado só para ele governar. A proposta foi feita em 1926, em carta enviada ao governador de Pernambuco, Júlio Mello.
Lampião propunha a divisão do estado em duas partes. Ele ficaria com o Sertão.
A ideia dele era acabar com as brigas entre os lados.
“Se o senhor estiver de acordo, devemos dividir os nossos territórios. Eu que sou capitão Virgulino Ferreira Lampião, Governador do Sertão, fico governando esta zona de cá por inteiro, até as pontas dos trilhos em Rio Branco. E o senhor por seu lado, governa do Rio Branco até a pancada do mar no Recife. Isso mesmo. Fica cada um no que é seu. Pois então é o que convém. Assim ficamos os dois em paz, nem o senhor manda seus macacos me emboscar, nem eu com os meninos atravessamos a extrema, cada um governando o que é seu sem haver questão”.
Proposta feita porque ele, Lampião, tinha “amor à Paz” e “para que não se diga que sou bandido, que não mereço”.
Pesquisas e registros orais, dos mais recentes aos mais antigos, mostram Lampião gozando de enorme influência entre políticos nordestinos, acobertado por uns, temido por outros, e, sem dúvidas, muito rico.
Quando assaltou a casa da baronesa de Água Branca em 26 de junho de 1922, levou dinheiro, joias, roupas, cabras leiteiras. Dizem que não tocou nos objetos de prata.
Antes de ser assassinado, em 28 de julho de 1938, conta-se que tinha tanto dinheiro que poderia fugir para a Europa e ter uma vida sossegada.
Dois dias após a execução do bando, o Diário de Pernambuco citava a fortuna de Lampião: “Estava composto o grupo de 58 bandidos na hora do ataque - teriam os cangaceiros em seu poder grande quantidade de dinheiro - entregou a um fazendeiro 5 quilos de ouro (...)”.
Também fala que já teria contratado um mestre de francês para mudar para a Europa. Com certeza um roteiro bem original para alguém que começou a trabalhar, cedo, de almocreve; teve sua primeira rixa com um subdelegado em Vila Bela; chegou a ter, no auge, mais de 100 homens sob seu comando até a morte em Angicos, Sergipe, por homens liderados pelo tenente João Bezerra, feito que a Polícia Militar de Alagoas toma para si.
Os jornais americanos deram destaque à morte do bandoleiro.
Eric Hobsbawm, talvez o maior historiador do século 20, comparava Robin Hood a Lampião. E disse, ao analisar delinquentes famosos (incluindo o cangaceiro) na obra Bandidos, que eles carregam algo em comum: são chamados de fora da lei por autoridades do Estado e heróis diante dos pobres, situação impulsionada em contextos de profunda desigualdade social ou econômica, caso do Nordeste brasileiro.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA