colunista

Alari Romariz

Alari Romariz atuou por vários anos no Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa de Alagoas e ganhou notoriedade ao denunciar esquemas de corrupção na folha de pagamento da casa em 1986

Conteúdo Opinativo

Uma mulher triste

23/01/2024 - 11:30

ACESSIBILIDADE


Administrar a velhice não é fácil! Vários são os problemas que aparecem: as pernas ficam fracas, a visão encurta, o esquecimento surge, o raciocínio enfraquece. O pior: fingir que está tudo bem e que você não teme a morte.
Recentemente, surgiu um pequeno caroço na língua, que virou câncer. Mais de três meses de sofrimento, culminando com uma cirurgia. Recuperação complicada, sem poder comer. Perda de três quilos.

Na fase de revisão, aparece uma alta de determinada proteína, podendo ocasionar outro câncer. E haja médico e remédio!

Quando coloco a cabeça no travesseiro, pensamentos negativos aparecem e começo a pensar que devo preparar-me para a morte. Quero deixar de tomar tanto remédio e ficar com a mente livre para elaborar a saída do mundo dos vivos. Não sei o que vou encontrar e como sobreviverei por lá. Procurei ajuda em Santo Amaro, mas ele não me escutou. Só me resta segurar nas mãos de Deus.

Hoje com 82 anos, continuo lúcida, aposentada, administrando minha casa da maneira que acho certa. Recebo amigos e parentes e faço tudo com dignidade. Tenho empregados de mais de vinte anos; acho, então, que sou uma boa patroa. Enfim, carreguei bem a cruz que Deus me deu.

Apesar de tudo isso, comecei a entender os chamados de Deus: Está na hora de parar, não tem mais forças, passe o bastão e vá meditar, procure saber qual será o seu fim. Deite, feche os olhos e seu anjo da guarda lhe mostrará o caminho. Não sirva de piada para os mais novos, não se deixe humilhar, não se deixe abater. Reaja com força e conserve sua lucidez.

Ouço sempre a frase: “Você está com 82 anos? Nem parece”. E ainda tento acreditar em certas palavras! Mas, sinto dores no corpo todo, a língua foi cortada, as forças são poucas. Sofro calada, para não ser chata ou uma velha rabugenta. Contudo procuro sempre estar alegre, conversando, recebendo hóspedes. Por dentro, no entanto, estou doente e sofro muito. Só quem sabe do meu sofrimento é Deus!

Perdi um filho, o meu João. Daí, então, passei a ver a vida de outro modo! Não entendo como Deus levou meu filho tão cedo. Apesar de estar perto de fazer três anos de sua ida para o céu, não deixo de pensar nele em nenhum dia do mês. Penso vê-lo sempre e depois foge.

Escorre, pelas mãos, o controle da casa, dos empregados, dos filhos, dos netos, e bisnetos. Sou, apenas, uma partícula de realce. Não sirvo para nada. Apenas, para ouvir: “Mamãe, não faça isso, não faça aquilo; cuidado, olhe o batente”. São observações especiais que me fazem até bem. Entretanto, na hora de decidir, nada de mamãe.

Profissionalmente falando, considero-me Assessora para Assuntos Resolvidos. Todos riem, mas virei conselheira dos mais novos. Com a experiência, vejo os perigos que rondam minha categoria. Enxergo mais longe, sou esquecida por ser velha, mas vigio tudo que poderá acontecer e sempre acerto. Nada recebo dos sindicatos, mas sinto que ainda posso servir aos funcionários do Poder Legislativo de Alagoas.

Não deixarei de escrever no EXTRA enquanto a cabeça estiver boa. É uma maneira de alimentar o cérebro e não ficar com Alzheimer. Procurarei levar notícias engraçadas do tipo: “Barco de Arthur Lira afunda na Barra de São Miguel. Não houve vítimas”. É engraçado: um deputado federal ter fazendas de luxo, boi de duzentos mil reais e outras coisas mais.

Como ainda sinto minha cabeça funcionar e um bom senso de humor, continuarei escrevendo, contando “causos”. Espero paciência de meus leitores.

Já fui uma mulher feliz, trabalhadora, boa mãe, boa avó, boa amiga. Hoje, sinto-me triste cansada, doente. Esperando o dia de ir embora. Deve vir logo e que longe da terra, seja melhor. Continuo rezando para Santo Amaro, mas ele não me ouve. Que pena!

Só resta que Deus me ouça!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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