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Odilon Rios

Odilon Rios é jornalista, editor do portal Repórter Nordeste e escritor. Autor de 4 livros, mais recente é Bode Pendurado no Sino & Outras Crônicas (2023)

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Glória e poder nas palmeiras imperiais

03/02/2024 - 06:00
Atualização: 03/02/2024 - 11:38

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DIvulgação
Casa-grande do Engenho Prata, em São Miguel dos Campos, e suas palmeiras imperiais
Casa-grande do Engenho Prata, em São Miguel dos Campos, e suas palmeiras imperiais

As famosas palmeiras imperiais ornam a arquitetura das casas-grandes, ajudando a simbolizar todo o prestígio econômico não apenas de uma época. Construção que remonta às glórias dos castelos medievais, a casa-grande é projetada para durar gerações, como o tempo de vida da palmeira imperial – em torno de 120 anos.

A longevidade mais o tamanho – a Roystonea oleracea pode chegar a 40 metros e é considerada uma das palmeiras mais altas do mundo – dão um toque de elegância e nobreza desejado pelo poderio econômico, principalmente àquele que não tinha nobreza no sangue mas com os bolsos cheios de dinheiro para comprar títulos, em verdade convites para ingressar na “alta sociedade”.

Anotam Douglas Apratto Tenório e Carmem Lúcia Dantas em “Caminhos do Açúcar: Engenhos e Casas-Grandes das Alagoas” que as casas-grandes dos engenhos alagoanos tinham em seus arredores as chamadas palmeiras imperiais, assim conhecidas por terem sido trazidas em 1808 ao Brasil por Dom João, que fugiu de Portugal enquanto Napoleão Bonaparte avançava pela Europa e destruía dinastias. O primeiro exemplar foi plantado em 1809 no Jardim Botânico.

Os cuidados oficiais buscavam evitar a popularização das palmeiras reais. Logo se descobriu que escravos trabalhando no jardim, na calada da noite e sem o consentimento da Coroa, ajudavam a vazar as mudinhas. E as palmeiras imperiais se espalharam pelo Brasil, chegando aos rincões das casas-grandes e nos engenhos Prata (São Miguel dos Campos), Lamarão (Pilar), Anhumas (União dos Palmares) e Olho d’Água (Maribondo) para citar alguns.

A planta cabia nestes jardins. Por séculos as casas-grandes eram a expressão mais alta e erudita do Brasil patriarcal, escreve Gilberto Freyre em Casa-Grande & Senzala. O senhor de engenho era o verdadeiro dono do Brasil, além de ser dono de homens, mulheres e terras. Com uma arquitetura própria e original, a casa-grande adaptou-se ao clima e em seu chão pisavam misticismos e fervores sexuais das carnes.

A casa-grande era cemitério, igreja, banco e fortaleza, lugar de tortura e estupros, amores, ódios e maldições. Até as almas penadas se recusavam a abandonar o lugar. Arrastavam-se pelas paredes, gritando por preces, abrindo e fechando portas, promovendo bailes assombrados.

Neste contexto estavam as palmeiras imperiais. Muitas delas ainda resistem de pé, segundo o livro “Caminhos do Açúcar: Engenhos e Casas-Grandes das Alagoas” enquanto as casas dos antigos senhores estão em ruínas ou bem conservadas, resistindo ao tempo. “Isso porque, com a decadência dos engenhos e a chegada das usinas, trazendo também mudanças na vida social do campo, as casas-grandes ou foram abandonadas ou mudaram de função”, escrevem Tenório e Dantas.

Os antigos foram esquecidos, as palmeiras imperiais varam os céus. Glórias são para sempre, gloriosos, não.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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