colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

Réquiem inacabado do Caso Braskem

16/12/2025 - 08:14
Atualização: 16/12/2025 - 09:16
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Os amigos da Braskem em Alagoas devem estar exultantes. A empresa foi vendida e, com a ajuda deles, aplicou um calote em 70 mil vítimas, deixando outras 60 mil clamando ao vento. Esses capachos cumpriram a vergonhosa missão de proteger a multinacional contra as 130 mil pessoas que ela ludibriou em Maceió.

Para se ter ideia da vassalagem desses maus alagoanos: os donos da empresa, Odebrecht e Petrobras, reinaram no estado por 25 anos sem sequer pisar em nossa terra. Bastava enviar funcionários de terceiro escalão para, em conluio, mandar e desmandar nas mais altas esferas do poder.

Fizeram o trabalho no qual são especialistas — como comprovou a Lava Jato: obtiveram o silêncio covarde de uns, a anomia descarada de muitos e a prevaricação de quase todos.

O escândalo financeiro

Após cinco anos de enrolação e uma relação tumultuada com os afetados — os únicos decentes nesta história — a empresa escolheu o caminho mais fácil: comprar o passivo com o município e o estado, e levar na maciota o acerto com seus credores em Alagoas, enviando esse passivo para as calendas.

  • O passivo com o município, estimado em R$ 8 bilhões, foi liquidado por apenas R$ 1,9 bilhão pago à Prefeitura. Uma operação escandalosa que deixou as vítimas a ver navios.
  • O passivo com o estado, avaliado em R$ 1,2 bilhão, foi parcelado em 10 prestações sem entrada, concedendo 10 anos para o pagamento. Um escândalo ainda maior.

Se Justiça e Polícia Federal fossem a fundo nessas transações, muita gente de colarinho branco estaria em apuros. Mas nada aconteceu. Todos sabem o porquê.

Os entes públicos, em vez de defender os 130 mil cidadãos — 14% da população da capital — vítimas da empresa, preferiram o jogo bruto do “comida pouca, meu pirão primeiro”. Abandonaram-nos miseravelmente.

O desastre e o engodo

A dura realidade: a multinacional destruiu 20% dos bairros de Maceió. Com a conivência das autoridades locais, aplicou um calote em 70 mil pessoas que perderam muito, e outras que perderam tudo, sem jamais receber um real de indenização.

Recusa-se a reabrir negociações com outras 60 mil vítimas, logradas em acordos abjetos, que até hoje clamam por justiça.

Não parou aí a sanha dos Odebrecht e da Petrobras — nos governos Bolsonaro e Lula, diga-se — tão responsáveis quanto os órgãos federais pelo maior desastre ambiental em área urbana do planeta.

Após destruir 2 milhões de m², tornaram-se donas da mesma área graças a uma artimanha jurídica. O que deveria ser compensação virou compra e venda, sob o olhar complacente da Justiça. Mais um esbulho, legitimado.

A falta de responsabilização

Nos últimos oito anos, os alagoanos assistiram, estupefatos e envergonhados, à atuação de suas lideranças, da Justiça, do Legislativo e dos capachos da Braskem. Sempre em favor da multinacional. Nenhum culpado até agora julgado pela justiça. Mas várias vítimas processadas pela Braskem na vã tentativa de calar oque é o sentimento de todos.

Um dia para não se esquecer

Ontem foi um dia triste para Maceió e para as vítimas da Braskem e da Petrobras de Maceió. Foi noticiado o entendimento final entre Novonor e Petrobras com os bancos credores.

Nenhuma menção ao passivo real devido às vítimas — R$ 16 bilhões. Zero aceno à negociação. Nenhuma consideração com a cidade onde foi cometido o maior crime ambiental do planeta. As tratativas giraram apenas em torno de como os bancos seriam ressarcidos e de como eles e a Petrobras dividirão o poder na nova configuração societária da empresa. Novamente, a parte fraca ficou de fora.

O legado da destruição

O preço dessa cumplicidade ficará cravado na história de Alagoas:

  • 140 mil vidas marcadas
  • 20%dos bairros engolidos destruídos completamente
  • A certeza de que, neste palco de injustiça, o lucro da multinacional sempre valeu mais do que o prejuízo das vítimas e a dignidade e a segurança dos maceioenses.

Enquanto os bancos celebram seus ressarcimentos, a justiça para as vítimas jaz soterrada no mesmo solo que a Braskem destruiu.

Este Réquiem inacabado deve reverberar para alertar a todos contra todos aqueles que venderam a alma em detrimento de nossa capital e de seus conterrâneos.

Não pode ficar por isso mesmo.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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