O Quebra: Associação Comercial protegeu liga criminosa
A destruição de 150 terreiros de matriz africana em Maceió no dia 2/2/1912 pela Liga dos Republicanos Combatentes foi uma ação que misturou o incentivo da imprensa, o contexto socioeconômico da maioria da população e os interesses de um grupo político que crescia e não encontrava espaço para chegar ao governo.
Nesta terceira e última parte da reportagem da série sobre o quebra de 1912 e a ação da Liga dos Republicanos Combatentes, mostraremos como elementos aparentemente divergentes se uniram para formar uma bomba que explodiu no maior e mais violento massacre da história brasileira contra terreiros. E a participação da Associação Comercial de Alagoas, protegendo a Liga, que estava a postos para novos momentos de terror.
A imprensa alagoana repercutia um discurso em voga na época, associando a prática de bruxaria aos terreiros. Incluindo a ligação do governador Euclides Malta com as religiões de matriz africana, sugerindo um pacto sobrenatural para o grupo permanecer por mais tempo no poder.
Além disso, o jornal “O Combatente”, assinado pela Liga, expunha a vida íntima dos escolhidos como inimigos. Não raro o Centro de Maceió fechava as portas diante das ameaças de quebra-quebra promovidas pelo grupo. E o governador Baptista Accioly era cobrado, em 1917, a tomar providências mais enérgicas. Além de apelos ao governo federal para que se decretasse, em Alagoas, intervenção federal.
Nem houve a intervenção nem a Liga parece ter sido importunada muito menos seus integrantes presos. Em 1917 chegava a Alagoas o ex-governador Gabino Besouro, que manifestava interesse em voltar ao Executivo. A Liga agiu. Fernandes Lima, talvez o principal (mas não o único) rosto do quebra, incentivava uma luta armada e escrevia cartas anônimas, segundo registra o Jornal do Brasil. O terror funcionou, mais uma vez. Ganhou Fernandes Lima.
A Liga tinha muitos aliados. Um deles era a Associação Comercial. A Revista Comercial das Alagoas, apoiada pela Associação, inclui o grupo na lista dos que homenageavam o governador Clodoaldo da Fonseca em 1913, portanto um ano após o quebra.
Já em 1914, a revista diz que o governador visitou a Liga, identificada pela publicação como “parte do proletariado alagoano”. Também na mesma revista a Liga se dispõe a tratar os “anarquistas” a “ferro e fogo”.
Portanto, a revista tratada como a maior voz dos produtores alagoanos – a Associação Comercial – tinha dentro dela a milícia responsável pelo quebra de 1912, além do roubo de símbolos e objetos dos terreiros.
Por isso, com um jornal próprio, governadores amigos (Clodoaldo, depois Accioly e em seguida Fernandes Lima eleito em 1918 a 1921 e reelegendo-se, deixando o Executivo em 1924) e o apoio da Associação Comercial, a Liga cresceu em poder, prestígio e força após o quebra.
Em 1913 era presidida pelo tenente Manoel Luiz da Paz e a sede do grupo funcionava na casa dele, na rua Doutor Miguel Omena, 69, endereço hoje bem próximo à feira da Levada, em Maceió. Pedro Ricardo da Silva também era citado no grupo, assim como Virgínio de Campos, também da Academia Alagoana de Letras.
Em 1921, a Liga cresceu. Além da presidência (tenente Manoel Luiz da Paz), tinha uma Secretaria de Movimento (Pedro Alves da Costa Correia), Secretaria de Propaganda (José Lúcio da Silveira), Secretaria de Representações (Virgílio Guedes), Secretaria Oficial (Euclides Cardoso Gomes) e Secretaria Especial (Ovintino José do Bomfim). Três anos depois, passa a ter uma Tesouraria (Olympio Bivar de Arroxelas Galvão).
Em 1930, conseguiu uma emenda de bancada da Câmara de Vereadores da capital para manter uma escola própria: a Miguel Omena.
Após esta data, a milícia associada ao extremismo e ligada às oligarquias alagoanas não consta mais nos registros históricos consultados. Mas as suas pegadas de sangue deixaram rastros que sobem as suntuosas escadarias da Associação Comercial, em Jaraguá. O tempo – e a história – mostram.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA