colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

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Lá vem o Brasil descendo a ladeira...

13/05/2020 - 10:36
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Conta a lenda que João Gilberto, ao ver uma mulata descendo do morro, criou a frase “lá vem o Brasil descendo a ladeira”, que Moraes Moreira e Pepeu Gomes eternizaram na magistral música que marcou o final dos anos 1970 e os anos 1980 em homenagem ao mestre João.

Saindo da esfera poética para o descampado da realidade atual deste país, adaptada, a frase é a perfeita conjunção dos males que estamos enfrentando. À pandemia atual – a maior de todos os tempos – soma-se a crise política vivenciada por uma gestão federal desatinada e a crise econômica que já presente, mas que será sentida em sua plenitude no pós Coronavírus.

Estudo recente de economistas da UFRJ indica que o fundo do poço de -3% do PIB indicado pelo FMI para o Brasil é, potencialmente, bem mais abaixo: até -11%! O estudo foi baseado na matriz insumo-produto adotada pelo IBGE em 2017, no âmbito do Sistema de Contas Nacionais. Mas é preciso se frisar que a FGV há dias estimou um tombo no PIB de até 14% e já houve até projeções de -20% para este ano. Correndo o risco de ser repetitivo, na grande depressão do final dos anos 1920 e início dos anos 1930, o PIB americano alcançou -5%. 

Esses números, aos olhos dos não iniciados, podem parecer algo distante. Nada mais errado. Cada ponto negativo do PIB equivale, grosso modo, a menos dois milhões de empregos. Ou seja, se o país chegar aos 14% estimados pela FGV, por exemplo, significa que 28 milhões de pessoas vão perder seus empregos este ano. Portanto, alcança em cheio, sim, cada um de nós. E às empresas que ficam sem o seu bem de maior valor.

Agora, não adianta os apressadinhos do negacionismo arguirem que é preciso “abrir tudo e logo, senão o país acaba”. Isso é sofismar com a vida alheia. Rapidinho: se abrir a epidemia explode, a rede de saúde já em pane acaba de se arrebentar, mais gente morre. 

E pior: de nada servirá para as empresas e para os empregos. A crise econômica já está dada. É inerente a situações desse calibre. Algumas empresas – mesmo com ajuda – vão quebrar. Outras serão incorporadas e as demais 19 milhões de unidades produtivas (segundo a Receita Federal/2020) seguirão em frente. Não é hora de se olhar para o detalhe. Há toda uma Nação a ser salva da débàcle pós-epidemia.

O país está ameaçado de entrar em depressão acompanhada por um quadro de deflação. Para quem não sabe que bicho é esse, e o que ele pode provocar na economia, deflação significa a queda generalizada e continuada dos preços. 

Bom! Alguém diria. Mas na deflação, empresas perdem receitas e – aí sim – podem quebrar aos montes, consumidores perdem renda (e reduzem compras) e o governo arrecada menos (minimizando sua já restrita capacidade de ajuda). Ah! Sim, a relação Dívida/PIB se arrebenta. É o caso de se dizer, usando linguajar médico, de falência múltipla da economia. A deflação é muito pior que a hiperinflação já vivenciada por aqui e que todos sabem o quão difícil foi.

Aí entra o papel do BC em gerir o regime de metas. Neste caso, injetando fortemente grana para cobrir os deficits do governo (a PEC 10/2020 já autoriza) para evitar o perigo deflacionário. Mas não pode errar a mão na monetização, senão a situação que já está sendo muito difícil, pode virar convulsão social.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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