colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

Zero à esquerda, mas manda muito e desmanda ainda mais em Alagoas

10/03/2024 - 07:40
Atualização: 10/03/2024 - 11:43

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A destruição que a Braskem provocou em Maceió, um Tsunami geológico-econômico-social de enormes proporções até hoje não teve qualquer solução por parte das autoridades responsáveis pelo enfrentamento direto do problema seja no âmbito municipal, seja no judiciário.

Até agora nada, muito pela atuação desassombrada daquela multinacional que a base de muita pressão, convescotes mil, cooptações e “otras cositas más” algumas muito felpudas como soi de acontecer com as raposas prontas para atrair os galináceos – neste caso, nada inocentes – para servirem de antepasto ao seu jantar indigesto de Maceió, de Alagoas e dos afetados pelo criminoso megadesastre.

Os absurdos são tais que a Braskem findou por sitiar Maceió, por terra (megadesastre e complexo químico no Pontal da Barra), água (proibição de navegação na Lagoa Mundaú), ar (proibição de voos sobre a área que ele destruiu) e pelo subsolo (esfarelamento das minas que ela nunca cuidou adequadamente)!

Algo inaudito na literatura mundial de desastres de grandes proporções como está sendo o de Maceió, o maior crime ambiental do planeta em área urbana cometido por uma empresa cloroquímica que passados seis anos, sequer foi indiciada pelo crime.

O que sempre me chamou a atenção nesse caso, é que até a velhinha de Taubaté do Veríssimo sabe que a mineração nunca foi uma atividade geradora de empregos e menos ainda de renda para as cidades/estados que a sedia (e vamos – de novo – mostrar isso logo a frente).

A quase totalidade da sua produção se destina ou à exportação ou para suprir como matéria-prima (portanto, de raso valor agregado) a outros estados onde se localizam as indústrias de segunda geração, de terceira e quarta geração, estas, sim, agregadoras de valor aos bens produzidos.

Ou seja: as promessas vãs esgrimidas durante quase 50 anos e até dois anos atrás quando desmontamos – com dados oficiais - a farsa sobre o potencial da Braskem como geradora de emprego e de desenvolvimento econômico para Alagoas, sempre foram nada mais que fakes.

Senão vejamos: Tá lá no nosso livro do qual fui o organizador e um dos coautores. A Braskem representa quase traço no PIB de Alagoas (a bem da verdade, menos de 0,4%. Um nada de muito pouco) e emprega tão somente 0,14% da força de trabalho formal do estado, ou seja, essa multinacional que nos esbulha e impõe a lei do mais forte, não passa de uma zero a esquerda do ponto de vista da geração de riquezas para Alagoas!

Para comprovar o que estamos afirmando, entre 2002 – ano em que a Braskem começou a operar substituindo a Trikem - até 2018 (os dados são do IBGE e consta do nosso artigo no livro), a renda per capita familiar média em Alagoas (em termos reais), teve uma impressionante redução de nada menos que 66%. Ou seja, o discurso fake Braskeniano que se arvorava da empresa ser o pilar do desenvolvimento do estado, nunca passou de uma quimera! Na verdade, Alagoas deu uma gigantesca retroagida em relação ao ano de 2002 e só recentemente começou a reagir. E não por causa da Braskem.

Mesmo um zero à esquerda para Alagoas a empresa, se utilizando de dados furados levou ao erro autoridades locais e “anestesiou” a população com suas notas anódinas, chatas e meticulosamente estruturadas para “vender o seu peixe”. E tem conseguido. Até agora...

Como tem se aproveitado da “expertise” da sua controladora, a antiga Odebrecht em negócios heterodoxos (que a levaram à condenação pela Lava Jato) para promover a mais escandalosa intervenção (digamos assim, para não falarmos pelo nome certo) em órgãos públicos, deles se beneficiando em detrimento dos 140 mil afetados, dos oito municípios “contaminados” pelo megadesastre, do governo de Alagoas e da cidade de Maceió, entregue à sanha da empresa pelo prefeito da Capital com o seu acordo-traição aos maceioenses.

Vamos listar quatro “cases” locais capazes de envergonhar até o Macunaíma, o heroi sem caráter do vanguardista da semana de 1922, Mário de Andrade. A ordem abaixo não aumenta ou diminui a gravidade de cada um dos “cases” listados.

1 - O Acordo Braskem-Prefeitura de Maceió - O inepto (por irregular) e aberrante acordo celebrado entre a prefeitura e a Braskem apunhala pelas costas quase um milhão de maceioenses e contém “perolas” como:

a) Fechar acordo no valor de 1,7 bi de reais quando o passivo real da destruição da Braskem em nossa capital supera a casa dos 8 bilhões de reais. Portanto, um valor 79% a menor do que a Braskem deveria pagar;

b) A “doação” irregularmente pelo prefeito (sem ouvir o legislativo, por exemplo) de ruas, avenidas, praças, becos, vielas, etc. situados nas áreas destruídas pela Braskem, para a... Braskem! A empresa responsável pela terrível destruição causada pelo megadesastre!

c) Achando pouco, o prefeito “aderiu” a prefeitura ao Acordo Braskem/MPF (já, já, falamos dele), uma excrescência legal que fez da empresa a “prefeita” da área que ela destruiu. A adesão irregular do prefeito fez Maceió se tornar refém de um acordo em tudo desvantajoso para a cidade, uma vez que quem adere, não pode mudar nada, exceto... aderir. Seria cômico se não fosse uma tragédia para a cidade!

d) Tão grave quanto: do dinheiro acertado, a Braskem foi logo avisando que iria “descontar” 700 milhões que, segundo ela, já teria “gasto” em Maceió. Ou seja: não satisfeita em destruir, a empresa agora – com o acoito do prefeito – também está exigindo ser ressarcida do que diz que utilizou em Maceió para reparar a cidade!!!

Há que se perguntar: o que faz um homem público, sem o aval de ninguém aceitar participar de uma lambança desse porte à vista de todos e na cara dos 140 mil afetados? Sensação de impunidade ou o quê?

2 - O Acordo MPF/MPE/DPU/DPE-Braskem – A nosso ver inconstitucional e desequilibrado em prol da empresa, o “acordo” precisa ser urgentemente objeto de escrutínio nos organismos máximos da justiça brasileira (o ideal seria que os envolvidos nessa trama da empresa encontrassem uma forma de anular o acordo. A meu ver foram traídos em suas confianças, o que por si só leva à anulação...).

a) Não pode um acordo não ter uma única cláusula que atenda aos interesses de Maceió ou aos afetados, inclusive o governo de Alagoas.

b) Não pode um acordo entre entidades de justiça e uma empresa privada conter “reserva de mercado” (como a Braskem fez) para a empresa indicar “consultorias” (sic) de sua confiança para realizar trabalhos voltados à recuperação de Maceió. Macaco não pode ficar perto das bananas, isso é básico.

c) Como não pode ainda menos a Braskem, além de selecionar (sem licitação) quem ela queria que fizesse os trabalhos (terminou sendo rejeitado pela comunidade técnica alagoana), ainda estipular quantias estratosféricas para pagá-las como, por exemplo, a bagatela de 192 milhões de reais por um simples estudo sócio urbanístico (que empresas reconhecidas do país estariam dispostas a realizar por menos de 10% daquele valor...). Tenho gritado aqui e vou gritar de novo: ALÔ POLÍCIA FEDERAL, siga o rastro do dinheiro...

d) Esse “Acordo” tem uma infinidade de outras “intervenções” injustificadas da empresa, como quando ele diz que vai pagar 150 milhões de reais de Danos Morais, como se fosse ela a estabelecer o valor adequado e não os afetados, governo do estado nessa também. Aliás, só para que os senhores tenham uma ideia esse valor apenas no caso de Alagoas deve ser superior em 50 vezes o que a Braskem impôs que iria pagar. De novo só rindo para não chorar...

e) No acordo permanecem órgãos vinculados ao governo de Alagoas. É preciso que eles saiam, e rápido. Afinal, a mulher de César não deve apenas parecer honesta. Ela precisa provar isso...

3. A CPI DA BRASKEM - Com a saída do senador Renan que a criou e viabilizou, a comissão, mais que nunca, precisa mostrar que a mulher de César não deve apenas parecer honesta. Afinal, se trata das esperanças de 140 mil afetados, oito municípios e do próprio governo de Alagoas...

4. Os organismos de classe- Onde estão os organismos de classe que sabiam de tudo que estava ocorrendo desde 2018 e calaram? São vários, já os denominei anteriormente, Alagoas sabe deles e os repudia.

Poderia me estender longamente sobre o mando e desmando da Braskem em Alagoas. Não há espaço para tal. Prefiro deixar aqui uma pergunta às autoridades e outros menos votados que porventura estejam jogando contra Maceió, as 140 mil pessoas afetadas, os oito municípios impactados e o governo de Alagoas.

Vocês conseguem olhar nos olhos dos seus filhos? Imaginam o que os seus amigos estão pensando de vocês (e não falam, mas condenam)? Conseguem imaginar o prejuízo que estão causando a Alagoas, a 3 milhões de pessoas? Conseguem dormir em paz? O sono dos justos?

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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