Os 75 anos da Faculdade de Medicina de Alagoas: uma travessia sertaneja
Texto de Ana Dayse Dórea – Médica graduada na Famed e reitora da Universidade Federal de Alagoas (gestão 2003/2011).
Ante a homenagem que recebo, ao ser incluída entre as 15 personalidades neste Jubileu dos 75 anos da Faculdade de Medicina de Alagoas/UFAL, imbuí-me de imediato do sentimento de gratidão àqueles que celebraram esta epifania. Afinal, esta faculdade é uma das quatro que formaram o núcleo fundador da Universidade Federal de Alagoas — patrimônio de Alagoas.
Ao mirar o retrovisor, vejo minha travessia construída com todos que, em minha vida, estenderam-se para o meu caminhar — da medicina exercida na saúde pública até a conquista, por eleição, do comando da Reitoria em dois mandatos da única universidade federal do Estado. Atualmente, com 26 mil alunos nos 84 cursos de graduação e cerca de 2.500 na pós-graduação.
Venho lá do Sertão... “SERTÃO É ONDE O PENSAMENTO DA GENTE SE FORMA MAIS FORTE DO QUE O PODER DO LUGAR” (Guimarães Rosa)... lá de Pão de Açúcar, e tive que desbravar caminhos. Lá, “o quem quiser viver que se prepare pra lutar”, de Shakespeare, funciona em tensão máxima, porque a aridez da paisagem ecoa, por vezes, nos embates da vida, tal como nas veredas do Grande Sertão de Guimarães Rosa. Meu chamado para a medicina foi visceral, como um eco da urgência por cuidar da saúde do povo, tão incessantemente punido pelas intempéries e pela falta de assistência.
A jornada até Maceió, para ingressar na Faculdade de Medicina, guarda similaridade com a busca incessante de Riobaldo por um sentido em meio ao caos do sertão — as distâncias sob o sol inclemente, a escassez de recursos e a descrença que assola os nascidos em solo árido, enfrentados com resiliência até o ideal acalentado desde os tempos de menina do Sertão.
Formada em Medicina, meu sonho e compromisso iniciais se derramaram na saúde pública, onde se materializou todo o meu empenho: enfrentando as endemias, as longas jornadas e a escassez cotidiana.
Monitora da disciplina Saúde Coletiva, meu caminho seguinte concluiu-se na docência universitária, que me inseriu de vez no universo da educação superior: dirigindo departamentos, o Centro de Ciências da Saúde, a vice-reitoria e, por fim, eleita reitora. Assim, fui abrindo veredas, espraiando esperança e futuro, como naquele dia em que um frentista de posto de gasolina fez questão de me agradecer, dizendo que estava cursando uma universidade pública. Eclodiu em mim a felicidade de Riobaldo, de que, se Deus existe, sempre há uma esperança, uma saída, uma possibilidade de solução. Assim como no sertão de Rosa, vi-me como agente de transformação onde antes a carência era o registro consolidado. O meu Sertão “virou mar”, um mar de conhecimento — e há muitas histórias bonitas a se contar.
Posso concluir que a Medicina foi determinante para a trajetória consolidada na Ufal, pelos muitos aprendizados, vivências e ricas experiências. Aproveito para reafirmar que nada teria sido possível sem o apoio, a confiança depositada e a parceria firmada para a superação de obstáculos e a execução de todo o meu trabalho como gestora. A todos, registro minha gratidão.
Ao comemorar suas “Bodas de Brilhante”, destaca-se a importância do curso da Faculdade de Medicina de Alagoas: o primeiro de todos, de onde tudo se originou até hoje, somando mais de 7 mil médicos formados para Alagoas, para o Brasil e para o mundo.
Um momento ímpar para o curso, para a Ufal e para a sociedade alagoana. Parabéns, Faculdade de Medicina de Alagoas/UFAL, pelos seus 75 anos de valiosa existência!
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA