Jogatina, eleições e problemas
O leitor que nos acompanha sabe que, em períodos eleitorais, quase me abstenho de opinar sobre candidatos ou sobre toda a “entourage” que circula em torno do assunto. Não tenho lado. Nem rabo preso com ninguém. O meu lado é Alagoas. Quem fizer o dever de casa em prol desta terra será elogiado; quem não fizer, será criticado. O máximo que faço é alertar que o seu voto – neste caso, para vereador e prefeito – é de importância capital para o que irá acontecer neste país futuramente. É desses cargos que sairão os futuros líderes políticos, locais e, até mesmo, nacionais. Portanto, saibam escolher bem.
Um exemplo disso? Há pouco tempo, o Congresso aprovou e o Lula sancionou a entrada das bets, ou seja, do jogo online no Brasil formalmente, uma vez que já vinha operando “na tora”, sem autorização legal, e ninguém, mas ninguém mesmo, se mexeu para dar um basta nessa situação anômala. Bem em linha com a corrupção massiva que impera neste país.
Durante dezenas de anos (desde o governo Dutra, que o proibiu), o lobby do jogo atuava neste país pela sua liberação, conseguida no governo de uma figura altamente controversa, que agora está nos bastidores da política: o ex-presidente Temer. Foi no seu governo que a jogatina foi autorizada a voltar a operar no Brasil ao aprovar, de afogadilho e quase por debaixo do pano, uma legislação frouxa, não discutida adequadamente no Congresso (que também é responsável por essa bandalha), e que agora explode em forma de “preocupações” (sic!) dos mesmos – dissimulados e corruptos – que aprovaram a excrescência da volta do jogo e, agora, do jogo online no Brasil.
Esta semana, o Banco Central deu o primeiro alerta sobre o mega-problema que se desenha no país. Soltou um informe com dados sobre a jogatina no Brasil. Vejam só: os brasileiros gastaram, apenas este ano (até setembro), nada menos que 180 bilhões de reais (e isso são apenas os valores contabilizados com pagamento via PIX; não entram cartões de crédito, de débito e outras modalidades de pagamento, o que elevará muito aqueles 180 bilhões). Só para se ter ideia, todos os jogos patrocinados pela Caixa Econômica (Mega-Sena, Lotomania, etc.) arrecadaram, no mesmo período, 17 bilhões de reais, ou apenas 10,5% da quantia destinada à jogatina...
O jogo, como se sabe, é altamente pernicioso para uma sociedade, e não apenas pelo número de dependentes que gera (no Brasil, 11% da população, ou 24 milhões de pessoas, jogaram ao menos uma vez este ano). Ele é um caso tão grave quanto o vício em drogas ou álcool, mas também causa efeitos deletérios na sociedade como um todo, que passa a conviver com o aumento da violência, a desestruturação de famílias e o brutal endividamento de pessoas (quando esgotadas suas fontes, elas recorrem até a agiotas, com as consequências conhecidas). E isso afeta, em especial, as pessoas mais simples.
Confrontado com os números chocantes do Banco Central sobre o jogo no Brasil, o presidente da República – o eterno inocente de tudo o que de ruim acontece neste país, tadinho – afirmou aos jornalistas estar – pasmem! – “surpreso” com o mega-problema que já assola o país de norte a sul, de leste a oeste. Ele, que de inocente nesse tema não tem nada, sancionou a lei que regulamenta o jogo online no Brasil, aprovada por suas excelências do Legislativo e do Executivo (foi no seu governo que isso foi votado e aprovado).
Mas o problema não para por aí. Por trás do jogo estão – e isso é um problema mundial – as máfias, o tráfico humano, o tráfico de drogas, os criminosos de alto coturno, o crime organizado. Uma das “premissas” dos donos das bancas é sempre contar com o “apoio” político e corporativo (em geral, da banda podre de cada país onde conseguem enfiar seus tentáculos e garras).
Neste país, onde as instituições estão a cada dia mais fragilizadas pela corrupção, com o crime organizado já presente nos Legislativos e Executivos, em parte do Judiciário e do setor privado, após a “abertura da porteira” para o jogo, a luta para controlá-lo será cada vez mais difícil. Os interesses aqui citados superficialmente são muitos e poderosos.
Não se enganem: o jogo é insidioso, maligno, e aqui nada tem a ver com religiosidade ou conservadorismo. Ele está associado e anda umbilicalmente ligado ao tráfico de drogas e de pessoas, às diversas máfias, à lavagem de dinheiro e à sonegação de impostos. E mais, muito mais. Isso só é possível com o aliciamento de políticos, o “convencimento” da Justiça e a promoção de lobbies no Executivo e no Legislativo para aprovar leis de seu interesse, visando ampliar o controle da máquina estatal do país, dos estados e dos municípios, fortalecer seu poder paralelo, quebrar à força o monopólio do Estado e eliminar sua capacidade de governança. As bets corroem a institucionalidade. O jogo é uma desgraça. Simples assim.
Agora, se a sociedade, atônita e passiva, não se mobilizar para pressionar seus representantes, nada acontecerá em termos de, pelo menos, uma regulação mais dura do jogo no Brasil. Apenas assim será possível obter mudanças significativas nessa bandalha.
E é bandalha mesmo. Num país em que uma empresa monopolista nas áreas de petróleo e gás dá prejuízo, o que mais esperar? (A Petrobras apresentou – pasmem! – um prejuízo de 344 milhões de reais neste último trimestre, e nada acontece). Os órgãos de fiscalização (os mesmos das bets) estão “dominados” e nada fazem além de relatórios amorfos, para não incriminar ninguém. Estamos voltando à bandalha desenfreada do fim do governo Dilma, agora sob os auspícios do governo Lula, que não poderá mais se esconder por trás da incompetente que foi impichada.
Quando, lá no início, alertamos para a responsabilidade do voto do eleitor, era disso que estávamos falando: essa gente que está governando esta Nação nas últimas décadas, e em todos os níveis, é o que de pior este país poderia desejar. São mercadores da destruição do futuro do Brasil.
É preciso dar uma chance a quem ainda não teve. E cobrar desses os compromissos assumidos. Ou então, vamos ficar na profecia do ex-deputado federal e presidente da Câmara Federal, Ulisses Guimarães, que, instado a opinar sobre a futura legislatura do país, afirmou: “Tá achando ruim? Espere pela próxima que vem aí…”
Pense bem antes de votar.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA