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Odilon Rios

Jornalista, editor do portal Repórter Nordeste e escritor. Autor de 4 livros, mais recente é Bode Pendurado no Sino & Outras Crônicas (2023)

Conteúdo Opinativo

O Quebra: paus, pedras e mortos nas eleições

22/02/2025 - 06:00
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Nos meses que antecederam o quebra dos terreiros em Maceió, a capital alagoana estava conflagrada. O Partido Republicano Conservador apoiava Natalício Camborim para o governo. O Partido Democrata anunciava Clodoaldo da Fonseca. E a violenta Liga dos Republicanos Combatentes escolheu apoiar Clodoaldo da Fonseca, sobrinho do alagoano Deodoro da Fonseca, mas nascido no Rio de Janeiro.

Publicamos nesta edição a segunda reportagem da série sobre a Liga dos Republicanos Combatentes, a milícia encabeçada pelas oligarquias alagoanas, responsável pelo quebra dos terreiros de matriz africana em 2/2/1912.

Em 26/12/1911, circula um boletim da Liga incentivando o povo a não pagar mais impostos enquanto não se realizasse seus direitos, ou seja, a vitória de Clodoaldo da Fonseca. Um dia depois, um levante popular termina na morte de dois artistas, o comércio da capital fecha as portas, o bonde deixa de circular por três horas, interrompendo a comunicação com os subúrbios. Famílias eram incentivadas a sair de casa e forçar donos de ferrarias e cutelarias a lhes dar objetos que viravam armas. Os policiais passaram a ser caçados nas ruas. Um deles quase foi linchado, a farda ficou despedaçada. Obrigados a vestir roupas civis e sob pressão, os soldados apoiavam os revoltosos e pediam a morte da oligarquia, neste caso a encabeçada pela família de Euclides Malta, que governava Alagoas.

Aquartelada e cercada, a polícia deixa as ruas e é substituída pelo Exército. Entre os dias 12 e 15/1/1912, mais boletins inflamando o ódio do povo: que ele tratasse com vaias, pedras e até à bala certas e determinadas pessoas citadas, chamadas ainda de víboras, bandidos e assassinos.

O inspetor da 6ª Região, general Julio Fernandes, lança um apelo público. Escreve uma carta aos jornais, publicada em 15/1/1912, pedindo ao povo que não seguisse os incentivos dos boletins, mantivesse a ordem e a liberdade dentro da lei.

Pouco adiantou. Os boletins eram anônimos e incluíam ameaças a quem votasse nos nomes da oligarquia, além de exigências. Tinham também uma característica comum: o apoio a Clodoaldo da Fonseca e os candidatos da chapa. Os dias avançam, chega a véspera da eleição (29/1/1912) e novos folhetos apócrifos insistem no voto na chapa de Clodoaldo da Fonseca. Talvez prevendo fraude nas eleições, exigiam mudanças na forma de votar, com o recebimento das cédulas na boca da urna para evitar fraudes.

Chega 30/1/1912, dia das eleições. A sessão de 16/5/1912 da Câmara dos Deputados, ao ler relatório da comissão de inquérito de 22/4/1912 sobre o caso Alagoas, reconstitui este momento: “O dia amanhecera com aspecto lúgubre: a cidade, como amodorrada por longas vigílias consequentes de profunda luta civil desperta, ainda a medo, sob a impressão terrorizante dos boatos da véspera – de que inevitavelmente ocorreriam graves conflitos”.

O banho de sangue não aconteceu, mas o medo estava no ar. Em uma seção na capital, por exemplo, estavam alistados 3.038 eleitores. Apenas 1.487 apareceram. Além das fraudes, que eram muitas, como dissemos em nossa reportagem da semana passada (O Quebra: as eleições fraudadas).

Naquela época o resultado das eleições não saía no mesmo dia, mas demorava semanas. E foi neste clima de terror que a Liga dos Republicanos Combatentes radicalizou: após a votação, uniu-se a uma horda cheia de ódio e gosto de sangue na boca e avançou sobre os terreiros em Maceió, com o argumento de que eles eram frequentados por Euclides Malta.

Era preciso, a qualquer custo, evitar a permanência da oligarquia no poder. Mesmo que isso implicasse em mais sangue e mortes.

Clodoaldo da Fonseca foi eleito e assumiu o governo em 12 de junho de 1912. Mas a Liga ganharia ainda mais força na eleição seguinte, como veremos na próxima semana.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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